Don Corleone, Johnny Fontane, Hyman Roth e tantos outros… figuras mundialmente conhecidas e admiradas da trilogia O Poderoso Chefão. O que poucos sabem é que suas histórias estão medonhamente alicerçadas sobre um fundo de verdade que nos faz refletir sobre a suposta honra do Padrinho. São histórias, personagens e assassinatos reais… Há muito mais que cannolis, as propostas irrecusáveis foram reais.
Breve esclarecimento
Baseada no livro O Poderoso Chefão, de Mario Puzo, a trilogia cinematográfica imortalizada por Francis Ford Coppola — O Poderoso Chefão, Parte I (EUA; Coppola; 1972); O Poderoso Chefão, Parte II (EUA; Coppola; 1974); e O Poderoso Chefão, Parte III (EUA; Coppola; 1990) — arrebatou milhões de fãs no mundo inteiro, sendo seus dois primeiros filmes considerados por muitos como os melhores da história. O que muita gente desconhece é que há um assombroso fundo de verdade em cada cena da trilogia.
Durante a criação deste artigo, notou-se, apesar da boa vontade, a complexidade do tema e restou decidido que o mesmo será confeccionado em partes devido à imensa quantidade de nomes, personagens e histórias, de modo que este material traz as considerações iniciais do todo e algumas das inspirações principais da trilogia, como o carismático Don Vito Corleone. Outrossim, sem desmerecer o trabalho dos atores, procurarei também não tratar seus nomes ao longo da matéria, visto a já declarada quantidade de prenomes e patronímicos.
Ainda, necessário se faz saber que todos mostrados aqui, sem exceção, coexistiram na mesma época — mais ou menos na primeira metade do século XX — sendo, inclusive, cúmplices, aliados e concorrentes mortais.
DON VITO CORLEONE
Abrindo a persiana, temos Don Vito “Corleone” Andolini. Certamente o mais famoso e carismático personagem da trilogia, sendo a si, inclusive, o título da trilogia conferenciado (título depois transmitido ao seu filho, Michael Corleone, que será abordado em momento oportuno). Apresentado nas partes I e II, foi o principal ator da sequência e emissor de frases e ações marcantes. Frases estas que se tornaram mundialmente conhecidas.
Apesar do comportamento calmo, amistoso e de quase se assemelhar a um santo para algumas pessoas, de santo Don Corleone não tinha nada. Definitivamente. Não se torna um Don sem extorquir, contrabandear e principalmente assassinar… A posição de chefe não é herdada de acordo com o berço, embora algumas vezes aconteça, ela é conquistada — tomada! — e somente os mais astutos e bravos “homens-feitos” sobem na hierarquia da Máfia. Os demais ou são subjugados ou morrem no percurso.
Na história real da Máfia, embora alguns autores e escritores maliciosos tendam a concentrar a vida de Don Vito Corleone em uma ou outra pessoa, parece claro, aos olhos da Criminologia e dos “entusiastas”, que sua inspiração decorre de uma gama de mafiosos mundialmente conhecidos, o que seria injusto declarar apenas um como iluminação definitiva. Entre os habitualmente referenciados, destacam-se três imigrantes italianos que nunca poderão ser deixados de lado, quais sejam: Joseph Bonanno, Charles “Lucky” Luciano e Carlo Gambino. O mafioso Al Capone raramente se mostra como referência de Don Vito por ter sido considerado um fanfarrão por diversos chefões da Máfia.
Joseph Bonanno, nascido na Sicília, na Itália, emprestou sua política, polidez e carisma ao Padrinho de Puzo e Coppola. Era temido e respeitado no submundo, era, definitivamente, o que a Maffia chama de “homem de honra”. Dentre todos os indicados, é geralmente o mais aceito como a grande inspiração para o Don das telonas.
Contrabandista de bebidas alcoólicas, assassino profissional, agiota, extorsionário e Don da Máfia, sempre se considerou, antes de tudo, um homem de honra, um homem para quem a tradição era absolutamente importante, para quem o bom nome e a boa reputação vinham antes de qualquer coisa. Considerado por muitos como o modelo para o Don Corleone de Mario Puzo, do best-seller O Poderoso Chefão, Joseph Bonanno incorpora tudo o que é inesquecível sobre o saber da Máfia, e talvez mais do que qualquer outro gângster na história resume bem o que era pertencer a La Cosa Nostra. (CARTER, 2007, p. 13, grifo autoral)
Charles “Lucky” Luciano, nascido na Sicília com o nome de Salvatore Lucania, sistematizou a Cosa Nostra (Máfia Ítalo-Americana) ao criar a Comissão no início da década de 1930 e se tornou seu grande chefão. A Comissão pode ser vista em diversos momentos, quando reunidos os dons debatem e deliberam sobre a pauta do dia.
Lucania foi o primeiro a se infiltrar verdadeiramente na política e a perceber que esse era o caminho natural para o fortalecimento do crime organizado transacional. Utilizando o sistema contra o próprio sistema, Salvatore Lucania criou uma grande e poderosa rede de corrupção internacional.
Cumprindo pena durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945), Charles “Lucky” Luciano fez um acordo com os Aliados em troca de sua liberdade: Favoreceria a invasão aliada na Itália, o que salvou a vida de milhares de soldados aliados, e denunciou espiões e sabotadores nazistas nos Estados Unidos. Em troca recebeu sua liberdade de volta sob a condição de nunca retornar à América.
Controlava apostas, casas clandestinas de jogos, prostituição e roubo de mercadorias. Com a Lei Seca (1919–1933), entrou para o ramo de contrabando de bebidas e criou uma rede de distribuição nacional e bares ilegais. Já em 1927 estava milionário. Quatro anos depois fundou o Sindicato do Crime [a Comissão], organização que agia em dez estados americanos e no Canadá. (AMORIM 2010, p. 356, acréscimo nosso)
Carlo Gambino, também nascido na Sicília, o mais poderoso chefão das décadas de 1960 e 1970, abarcou para si o título de verdadeiro chefe mafioso e foi um dos mais pérfidos assassinos em sua sangrenta ascensão na hierarquia da Cosa Nostra. Para Gambino, o poder era o único modo de se impor respeito à corrupta e vergonhosa sociedade, era o único modo de viver com “dignidade”.
Carlo Gambino foi uma força incrivelmente poderosa, tanto como um homem de negócios legais, com interesse em firmas de construção e fábricas, quanto como criminoso, incluindo a influência opressiva que exercia sobre os sindicatos. (CARTER, 2007, p. 98-99)
Todos eles forneceram subsídios para a construção do mítico Don Corleone. Ora com sagacidade e política, ora com sangue e glamour. Também é amplamente conhecido que os supracitados mafiosos foram os responsáveis pela reformulação e condução do crime organizado moderno durante décadas.
JOHNNY FONTANE (FRANK SINATRA)
Frank Sinatra, ator e cantor norte-americano de ascendência italiana e eterno ídolo de diversas gerações. Astro de filmes e inesquecíveis canções que embalaram casais apaixonados. Dono de diversos prêmios internacionais e com o nome cravado na Calçada da Fama de Hollywood, Frank, como muitos outros astros, também possuía suas ligações com a Máfia Ítalo-Americana – Cosa Nostra.
Embora a sequência não dedique tanta importância a Johnny Fontane, o livro destina boa soma de páginas ao personagem que, entre uma ou outra discórdia, teria sido inspirado em Frank Sinatra. As semelhanças, de fato, são imensas e a obra literária de Mario Puzo traz diversas histórias semelhantes aos fatos reais da vida de Sinatra. Puzo, inclusive, teria sido ameaçado por Sinatra algumas vezes.
Em 1998, Tina Sinatra, a filha de Frank Sinatra, revelou o envolvimento do pai com a máfia com detalhes, o que também incluiu esquemas de mútua ajuda na campanha presidencial de John F. Kennedy contra Nixon. O Federal Bureau of Investigation (FBI) possui mais de duas mil páginas acerca do passado “duvidoso” de Sinatra.
Frank Sinatra, sem dúvida, viveu em uma época extraordinária e foi cercado por homens igualmente extraordinários. Bastante do glamour norte-americano decorre do cotidiano dos mafiosos e, embalados pelas músicas de Frank, muitos mataram e morreram impondo seu jeito, fazendo tudo do seu jeito, como na emocionante canção My Way.
HYMAN ROTH (MEYER LANSKY)
Na parte II de O Poderoso Chefão surge Hyman Roth, um gângster judeu que teria sido inspirado em Meyer Lansky. O filme, onde importante parte da ambientação se passa em Cuba, revela os investimentos da Máfia na então ilha do ditador Fulgêncio Batista, uma marionete dos gangsteres que acaba sendo deposto com o sucesso da Revolução Cubana (1959).
O filme mostra o judeu como traidor, mas, na vida real, Lansky foi muito mais que um aliado dos ítalos-americanos: foi uma pulsante e inesgotável fonte de lucro para seus amigos (fato relatado no filme, quando se diz que ele “ele sempre traz lucro para seus amigos”).
Meyer Lansky, nascido como Maier Suchowljansky na Polônia ou Rússia (nascimento incerto), era um sujeito pacato e sempre procurou distância dos holofotes da imprensa. Acabou a vida conhecido na história como “o Cérebro”, ou “o Homenzinho”, do crime organizado moderno e foi um dos alvos mais proeminentes do Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Tornou-se conhecido por sua inteligência, cordialidade e capacidade de se manter um passo à frente dos demais, trabalhando com tudo dentro e fora dos Estados Unidos.
Mesmo com diversos órgãos do governo no seu encalço por décadas, o gangster judeu passou pouquíssimo tempo preso ou detido e encerrou sua carreira de delitos ao morrer tranquilamente aos 80 anos de idade. Tão bem-sucedida foi a sua carreira que nos últimos anos de vida as agências do governo acabaram “desistindo” de prendê-lo.
Lansky atuou com figuras lendárias da Cosa Nostra, como Charles “Lucky” Luciano (amigo desde a juventude), Carlo Gambino, Joe Bonanno e tantos outros dons que mostraram ao mundo como crime organizado funciona.
MOE GREENE (BENJAMIN “BUGSY” SIEGEL)
Embora o personagem tenha pouco aparecido na parte I da trilogia e seja custoso trazer um paralelo à tela, Moe Greene — aquele que acolheu Fredo após o incidente com Don Vito Corleone — foi diretamente inspirado nas ações e estilo de vida do gangster judeuBenjamin “Bugsy” Siegel, um dos mais perversos e destacados de sua estirpe.
Tal inspiração fica evidenciada na parte II da sequência de Coppola, quando Hyman Roth, diretamente, acusa Michael Corleone do assassinato de Moe Greene (fato ocorrido no fim da parte I, quando diversos chefões rivais são assassinados simultaneamente). A morte de Greene, com um tiro no olho, também foi inspirada na vida real, visto que, entre os disparos que acarretaram a morte de Siegel, um se destacou por ter atingido seu olho.
O nome Moe Greene também é uma junção dos nomes dos dois mafiosos que sucederam Siegel na administração do Cassino Flamingo, Moe Sedway e Gus Greenbaum.
Acerca de Benjamin, diz-se que contribuiu generosamente na parte mais violenta do moderno crime organizado, também sendo, por sua pompa e boa aparência, o principal articulador entre criminosos e políticos e o idealizador da cidade de Las Vegas. Juntamente com Lansky, Siegel criou bases de operação criminosa no estado de Nevada, onde os jogos de azar foram liberados após a Quebra da Bolsa de Wall Street (1929), o que possibilitou a construção de grandes e luxuosos cassinos próximos a Hollywood. Também atuou na “conquista” de Cuba e do México.
Atraente, elegante e de hábitos refinados, Benjamin “Bugsy” Siegel carregou consigo durante décadas a fama de galã do submundo e amante de estrelas de Hollywood — perigosamente popular entre senhoras e senhoritas. Assassino, sádico, estuprador e reputado como sociopata — indiferente aos crimes mais repugnantes. Ben, como era chamado por seus íntimos, foi um dos gângsteres mais implacáveis da história, ainda que sua violência igualmente convivesse com sua notória beleza e seus hábitos galanteadores. Ao nome de Siegel também se associa outro feito: transformar uma pequena cidade no meio do deserto na Cidade do Pecado — Las Vegas! (BEZERRA, 2015, s/p)
Contrabandista de bebidas alcoólicas, assassino profissional, agiota, extorsionário e Don da Máfia, sempre se considerou, antes de tudo, um homem de honra, um homem para quem a tradição era absolutamente importante, para quem o bom nome e a boa reputação vinham antes de qualquer coisa. Considerado por muitos como o modelo para o Don Corleone de Mario Puzo, do best-seller O Poderoso Chefão, Joseph Bonanno incorpora tudo o que é inesquecível sobre o saber da Máfia, e talvez mais do que qualquer outro gângster na história resume bem o que era pertencer a La Cosa Nostra. (CARTER, 2007, p. 13, grifo autoral)
Lucania foi o primeiro a se infiltrar verdadeiramente na política e a perceber que esse era o caminho natural para o fortalecimento do crime organizado transacional. Utilizando o sistema contra o próprio sistema, Salvatore Lucania criou uma grande e poderosa rede de corrupção internacional.
Controlava apostas, casas clandestinas de jogos, prostituição e roubo de mercadorias. Com a Lei Seca (1919–1933), entrou para o ramo de contrabando de bebidas e criou uma rede de distribuição nacional e bares ilegais. Já em 1927 estava milionário. Quatro anos depois fundou o Sindicato do Crime [a Comissão], organização que agia em dez estados americanos e no Canadá. (AMORIM 2010, p. 356, acréscimo nosso)
Carlo Gambino foi uma força incrivelmente poderosa, tanto como um homem de negócios legais, com interesse em firmas de construção e fábricas, quanto como criminoso, incluindo a influência opressiva que exercia sobre os sindicatos. (CARTER, 2007, p. 98-99)
Atraente, elegante e de hábitos refinados, Benjamin “Bugsy” Siegel carregou consigo durante décadas a fama de galã do submundo e amante de estrelas de Hollywood — perigosamente popular entre senhoras e senhoritas. Assassino, sádico, estuprador e reputado como sociopata — indiferente aos crimes mais repugnantes. Ben, como era chamado por seus íntimos, foi um dos gângsteres mais implacáveis da história, ainda que sua violência igualmente convivesse com sua notória beleza e seus hábitos galanteadores. Ao nome de Siegel também se associa outro feito: transformar uma pequena cidade no meio do deserto na Cidade do Pecado — Las Vegas! (BEZERRA, 2015, s/p)
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